VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL – A JUÍZA E A CRIANÇA

Publicada em 27 de junho de 2022

Novo artigo de nosso sócio diretor, Dr. Olindo Barcellos da Silva, publicado no Jornal Gazeta do dia 24/06/2022

A Lei 14.321, se 22 de março deste ano, inseriu o artigo 15-A na Lei de Abuso de Autoridade e trouxe consigo a normatização da “violência institucional”. Conceitualmente, a violência institucional é “submeter a vítima de infração penal ou a testemunha de crimes violentos a procedimentos desnecessários, repetitivos ou invasivos, que a leve a reviver, sem estrita necessidade: a situação de violência; ou outras situações potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização”. Também “Se o agente público permitir que terceiro intimide a vítima de crimes violentos, gerando indevida revitimização, aplica-se a pena aumentada de 2/3 (dois terços)” ou se “o agente público intimidar a vítima de crimes violentos, gerando indevida revitimização, aplica-se a pena em dobro.” Estão sujeitos a aplicação da lei todos os agentes públicos, inclusive Delegados(as) de Polícia, Promotores(as) de Justiça e Juízes(as).

Pois é justamente nos dispositivos acima que me parece ter incidido a juíza do triste caso da menina de 11 anos, amplamente repercutido em noticiários e nas redes sociais. A criança foi ao Judiciário para pedir autorização para um aborto legal, já que foi vítima de abuso sexual. Me restrinjo ao aspecto legal, já que causou estupenda comoção e gigantesca revolta a conduta da magistrada e a omissão da representante do Ministério Público. Consta que a Corregedoria do Ministério Público abriu investigação sobre a conduta da Promotora, Mirela Dutra Alberton. Também a Corregedoria do Tribunal de Justiça de Santa Catarina abriu sindicância contra a juíza Joana Zimmer que, ou estava num dia de rara infelicidade, ou vive num mundo próprio, à parte dos demais. Fazer uma criança vítima de crime sexual, que conta apenas 11 anos, ter que reviver uma experiência traumática e sair do Judiciário, onde foi buscar amparo e o cumprimento da lei, com o trauma multiplicado é desumano e ilegal. Necessário ressaltar que nem de longe é a conduta usualmente praticada por Juízes(as) e Promotores(as) de Justiça.

No Estado Democrático de Direito, onde o princípio da dignidade humana foi alçado a um dos fundamentos da República brasileira, o respeito não precisaria constar numa lei de caráter penal. Estarrecedor que praticado por uma magistrada contra uma criança. Na “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”, em 1785, Kant já trazia que “o homem… existe como fim em si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade”. É triste, muito triste que seja necessária uma lei penal para impor respeito a uma criança que, na primeira vez foi vítima do abuso sexual e, na segunda, vítima da insensibilidade e desumanidade praticadas contra si, por quem deveria lhe dar amparo, apoio e respeito.