DANIEL ALVES E A FIANÇA

Publicada em 22 de março de 2024

Novo artigo de nosso sócio Diretor, Dr. Olindo Barcellos da Silva, publicado no Jornal Gazeta Mineira do dia 22/03/2024

O futebolista brasileiro Daniel Alves foi condenado na Espanha, em fevereiro, pelo delito de estupro a uma pena de quatro anos e meio de prisão. Esta semana teve concedida pela justiça espanhola a liberdade provisória até o julgamento do seu recurso. Para tanto, foi fixada uma fiança de 1 milhão de euros, além de precisar entregar seus dois passaportes, brasileiro e espanhol, às autoridades, comparecer semanalmente aos tribunais e manter ao menos 1 km de distância da vítima. Convém lembrar que, da sentença, tanto defesa quanto acusação recorreram, a primeira pedindo pena de 9 anos e a defesa a absolvição ou redução da pena.

O que causou enorme e imediata repercussão nas redes sociais foi a condição da liberdade provisória estar condicionada ao pagamento de fiança. Realmente, para o leigo pode passar a estranha ideia de “compra” da liberdade provisória, o que não combina com o Direito Penal. A característica maior das punições penais são a perda da liberdade ou a restrição de direitos.

Não que este ramo do direito deixe de estabelecer, em menor grau, penas pecuniárias. A fiança é estabelecida e regulada pela legislação penal de cada país, portanto, seus critérios e valores variam. No caso do Brasil, a fiança está regrada no artigo 319, VII (nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial)” no artigo  322 (A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos) e no parágrafo único deste último (Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas).

A aplicação da fiança está condicionada a diversos fatores, como a natureza do crime, a personalidade do acusado, sua situação financeira, e se há riscos para a ordem pública. No caso do Brasil o crime de estupro é considerado hediondo e, como tal, inafiançável. 

O que se deve ter em mente é que não houve a “compra da liberdade”, até porque o processo continua, em nível de julgamento dos recursos, e a pena pode ser aumentada, diminuída ou mesmo (embora improvável neste caso) haver a absolvição. Também deve ser considerado que, mesmo sem qualquer condenação, Daniel Alves já cumpriu dois anos de prisão. Ainda, mantendo ou aumentando a condenação, a fiança não vai estabelecer sua liberdade. Ou seja, mantendo-se a condenação nos graus recursais, a pena volta a ser cumprida. Não há qualquer privilegiamento a um réu famoso ou aviltamento da dor e sofrimento da vítima, como algumas notícias insinuam, quando não afirmam. 

Então é preciso que examine a situação com um mínimo de informação jurídica e sem o passionalismo com que está sendo tratado pelas redes sociais.