RACISMO REVERSO – CRUELDADE

Publicada em 4 de fevereiro de 2022

Novo artigo de nosso sócio diretor, Dr. Olindo Barcellos da Silva, publicado no Jornal Gazeta do dia 04/02/2022

Está na moda a expressão “racismo reverso” que, grosso modo, significa a discriminação de grupos étnicos não necessariamente minoritários, mas perseguidos através da história.

É preciso acima de tudo que se contextualize, histórica e geograficamente, a aplicação. Na África do Sul pós-apartheid, por exemplo, a questão surgiu porque a enorme maioria da população negra não tinha acesso a espaços ocupados por brancos e, quando passou a tê-los, teria surgido este novo tipo de racismo, condenado até mesmo por Nelson Mandela.

No Brasil, a situação é completamente diferente. Em primeiro lugar, os negros que para cá vieram, não fizeram a travessia de forma espontânea, mas acorrentados e subjugados. A própria viagem já era um risco. Dos 12 milhões de escravos trazidos da África para as Américas, 1,8 milhão morreu na viagem, ou seja, 15% dos negros embarcados como escravos sequer chegavam aos destinos com vida. Outros 1,2 milhão de negros não resistiu aos primeiros 3 anos de escravidão. E os que conseguiam sobreviver eram afastados de suas famílias, quando faziam juntos a viagem, e tratados como “coisa”, propriedade do senhor. A tal ponto que a compra de novos escravos era mais barata do que esperar que aqueles já “adquiridos” reproduzissem.

Nosso país, por mais de 3 séculos, foi a maior nação escravista do mundo, do que não podemos ter orgulho. O Brasil recebeu 5 milhões de negros escravizados, 40% dos 12 milhões embarcados para as Américas. O IBGE aponta a marca de 115 milhões de pretos e pardos. As marcas da cruel escravidão ainda hoje se fazem sentir. Embora pretos e pardos representem 54% da população brasileira, sua participação entre os 10% mais pobres do país representam 78%. Enquanto a população branca tem 22,2% com 12 ou mais anos de estudo, o índice para a população negra é de 9,9%. Um ser humano negro tem 8 vezes mais chances de ser vítima de homicídio do que um branco, no Brasil. Entre os deputados estaduais, distritais (Distrito Federal), federais e senadores do Brasil, apenas 4% são negros. Os brancos representam 90% dos engenheiros, 88% dos pilotos de aeronaves, 89% dos professores de Medicina, 83% dos veterinários e 79% dos advogados, embora representem menos da metade da população, segundo levantamentos da Universidade de Brasília e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Por tudo isto, e muito mais que não cabe neste espaço, mas que nunca pode ser esquecido, atribuir a uma população historicamente escravizada e empobrecida um racismo do qual foi vítima é mais uma crueldade que contra ela se pratica.