A paz como direito humano

Publicada em 21 de fevereiro de 2022

Novo artigo de nosso sócio diretor, Dr. Olindo Barcellos da Silva, publicado no Jornal Gazeta do dia 18/02/2022

Com a iminente invasão da Rússia à Ucrânia, que parece pelo menos estar suspensa, há que se pensar na paz como um direito humano. A referência aqui é a direito humano, mais do que direito fundamental. Os direitos fundamentais são direitos do seu humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional de determinado Estado, enquanto os direitos humanos por sua vez, guardam relação com o direito internacional e com os mais altos valores da humanidade, não limitados a um país. Então, a ideia de paz permanente diz com o mundo todo e não apenas com determinado país.

A ideia de paz é um direito natural e deve ser aspiração de todos os povos, decorrente tanto da doutrina contratualista de Rosseau como da paz perpétua advogada por Kant. Paulo Bonavides, nosso grande e saudoso constitucionalista, já definia como “estuário de aspirações coletivas de muitos séculos, a paz é o corolário de todas as justificações que a razão humana, sob o pálio da lei e da justiça fundamenta o ato de reger a sociedade, de modo a punir o terrorista, julgar o criminoso de guerra, encarcerar o torturador, manter invioláveis as bases do pacto social, estabelecer e conservar, por intangíveis, as regras, princípios e cláusulas da comunhão política”.

A questão da Ucrânia é, como quase todas do direito internacional, muito complicada. Há um grande contingente da população de origem russa no país. Na década de 90, a Otan – Organização do Tratado do Atlântico Norte havia se comprometido em não avançar ao Leste, especialmente nos países limítrofes à Rússia. Esta, por sua vez, entende que precisa de um “cinturão” de controle nos países limítrofes, antigamente vinculados à União Soviética e ao Pacto de Varsóvia (já extinto), como garantia de sua segurança. Em contrapartida, a própria Ucrânia e os países do ocidente esgrimam o princípio da autodeterminação dos povos e da não intervenção de um Estado em outro.

Claro que no meio disto tudo há reflexos surreais no Brasil, como a crítica que antibolsonaristas fizeram da visita do presidente ao monumento do que chamaram de soldado russo. Para não ficar atrás houve postagens de bolsonaristas em redes sociais afirmando que o presidente auxiliou para evitar a invasão russa. Ora, duas abissais bobagens. O presidente, como Chefe de Estado, visitou um monumento aos solados mortos na segunda guerra, num gesto de respeito e polidez. Ademais, a União Soviética foi fundamental na vitória dos aliados contra o regime nazista. Mas a posição do presidente ou do Brasil não tem a menor influência nas decisões de Vladimir Putin, presidente da Rússia.

Excluindo as duas posições, que mais parecem piada, há que se comemorar o fato de que, contrariando todas as posições, pelo menos por enquanto a paz triunfa. Que este triunfo não só seja mantido, como ampliado a todos os cantos do mundo.